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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Eu Também Roubei varias Rosas!


Ainda bem que as rosas não falam simplesmente as rosas exalam perfumes!
 
Que alivio que senti ao ler o texto de Clarice Lispector e saber que ela também roubava rosas. O meu sentimento de pecadora se transformou em poesia!

Eu tenho uma vizinha que tinha roseiras lindas, somos vizinhas à 39 anos, não vou arriscar a dizer  o nome dela, vai que alguém lê isso aqui e me denúncia. Melhor não arriscar. ( risos).

As rosas roubadas era pra minha professora preferida dona Amélia, Dona Amélia é que  era  professora de verdade.
 
Ela Amava as rosas! E eu amava ver seus olhos brilharem!    

Ontem a Tina me chamou de flor de Goiás e o Manoel concordou,  dai resolvi roubar virtualmente duas flores do cerrado. Flor de pequizeiro e presenteá-los. Essa é pra vc Tintina e para Manoel, uma pra cada!

Essa é a verdadeira flor de Goiás!
 
 
Texto de Clarice Lispector
Cem Anos de Perdão
 
Quem nunca roubou não vai me entender. E quem nunca roubou rosas, então é que jamais poderá me entender. Eu, em pequena, roubava rosas.
Havia em Recife inúmeras ruas, as ruas dos ricos, ladeadas por palacetes que ficavam no centro de grandes jardins. Eu e uma amiguinha brincávamos muito de decidir a quem pertenciam os palacetes. "Aquele branco é meu." "Não, eu já disse que os brancos são meus." Parávamos às vezes longo tempo, a cara imprensada nas grades, olhando.
Começou assim. Numa dessas brincadeiras de "essa casa é minha", paramos diante de uma que parecia um pequeno castelo. No fundo via-se o imenso pomar. E, à frente, em canteiros bem ajardinados, estavam plantadas as flores.
Bem, mas isolada no seu canteiro estava uma rosa apenas entreaberta cor-de-rosa-vivo. Fiquei feito boba, olhando com admiração aquela rosa altaneira que nem mulher feita ainda não era. E então aconteceu: do fundo de meu coração, eu queria aquela rosa para mim. Eu queria, ah como eu queria. E não havia jeito de obtê-la. Se o jardineiro estivesse por ali, pediria a rosa, mesmo sabendo que ele nos expulsaria como se expulsam moleques. Não havia jardineiro à vista, ninguém. E as janelas, por causa do sol, estavam de venezianas fechadas. Era uma rua onde não passavam bondes e raro era o carro que aparecia. No meio do meu silêncio e do silêncio da rosa, havia o meu desejo de possuí-la como coisa só minha. Eu queria poder pegar nela. Queria cheirá-la até sentir a vista escura de tanta tonteira de perfume.
Então não pude mais. O plano se formou em mim instantaneamente, cheio de paixão. Mas, como boa realizadora que eu era, raciocinei friamente com minha amiguinha, explicando-lhe qual seria o seu papel: vigiar as janelas da casa ou a aproximação ainda possível do jardineiro, vigiar os transeuntes raros na rua. Enquanto isso, entreabri lentamente o portão de grades um pouco enferrujadas, contando já com o leve rangido. Entreabri somente o bastante para que meu esguio corpo de menina pudesse passar. E, pé ante pé, mas veloz, andava pelos pedregulhos que rodeavam os canteiros. Até chegar à rosa foi um século de coração batendo.
Eis-me afinal diante dela. Para um instante, perigosamente, porque de perto ela é ainda mais linda. Finalmente começo a lhe quebrar o talo, arranhando-me com os espinhos, e chupando o sangue dos dedos.
E, de repente - ei-la toda na minha mão. A corrida de volta ao portão tinha também de ser sem barulho. Pelo portão que deixara entreaberto, passei segurando a rosa. E então nós duas pálidas, eu e a rosa, corremos literalmente para longe da casa.
O que é que fazia eu com a rosa? Fazia isso: ela era minha.
Levei-a para casa, coloquei-a num copo d'água, onde ficou soberana, de pétalas grossas e aveludadas, com vários entretons de rosa-chá. No centro dela a cor se concentrava mais e seu coração quase parecia vermelho.
Foi tão bom.
Foi tão bom que simplesmente passei a roubar rosas. O processo era sempre o mesmo: a menina vigiando, eu entrando, eu quebrando o talo e fugindo com a rosa na mão. Sempre com o coração batendo e sempre com aquela glória que ninguém me tirava.
Também roubava pitangas. Havia uma igreja presbiteriana perto de casa, rodeada por uma sebe verde, alta e tão densa que impossibilitava a visão da igreja. Nunca cheguei a vê-la, além de uma ponta de telhado. A sebe era de pitangueira. Mas pitangas são frutas que se escondem: eu não via nenhuma. Então, olhando antes para os lados para ver se ninguém vinha, eu metia a mão por entre as grades, mergulhava-a dentro da sebe e começava a apalpar até meus dedos sentirem o úmido da frutinha. Muitas vezes na minha pressa, eu esmagava uma pitanga madura demais com os dedos que ficavam como ensangüentados. Colhia várias que ia comendo ali mesmo, umas até verdes demais, que eu jogava fora.
Nunca ninguém soube. Não me arrependo: ladrão de rosas e de pitangas tem 100 anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem para ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.
 
Eu te entendo Clarice!
 
 

7 comentários:

  1. Nada como ter alguém da importância e carisma de Clarice Lispector como referência para nossos mal feitos.
    \o/
    Esse texto vai ser salvo, impresso, repassado...
    :)
    Pois o batismo agora está feito e é oficial, flor de goiás tu serás.
    E tenho dito!
    Essa flor de pequi é uma lindeza, delicadeza, amareleza. E ainda é cheirosa?
    Deus estava inspirado nesse dia.

    Eu não sei se vc sabe, mas há um boca-a-boca que diz que só gosta de pequi quem é daí. Até deu rima.
    Um dia darei meu testemunho.

    Por hora agradeço pela flor, amo ganhar flores, seja das de matinhos roubadas na rua, seja um buquê de rosas. Sei! Não duram como diamantes, mas vidas não duram como diamantes e são preciosas.

    Eu já roubei flores, frutas, mudas de plantas, pedrinhas de vizinhos e também revistas de recepção de clinicas ou páginas delas, já peguei pedacinhos de papel para anotação sorrateiramente de diversos lugares e Clarice não citou esses mal feitos como poéticos, a quem recorro para minha indulgência?

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  2. Kkkkkkkk,Recorra ao Robin Hood!
    Ou reza uma Ave Maria e pai nosso. Tá absolvida!
    Eu também já fiz isso! rssrs

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  3. Nunca imaginei que o pequi tivesse tão exuberante flor!
    Linda, linda senhora Flor de Goiás !
    E já que o momento é de confissão: também já roubei página de revista em consultório.
    Bj

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  4. Caramba, como a flor do pequi é linda!
    Estou encantada!
    Aproveitando as confissões: eu já roubei uma revista de um consultório. Tinha uma matéria incrível dos 'Backstreet Boys' e eu era fã! Meus olhinhos brilharam!! *-*

    beijinhos :*
    Carol
    Um blog simples
    Sorteio de coisinhas ♥

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  5. Vim agora do blog da Tina, Alê, onde me instalei, porque gostei da proposta dela (professora que fui...sou). Cheguei aqui, ao ler seu comentário e clicando no seu retratinho...(sabe, aquela cadeia?).

    Já roubei rosas e já recebi rosas roubadas, faz é bem!
    Bela homenagem, linda a flor verdadeira de Goiás.
    Um beijo, Alê,
    da Lúcia

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  6. Alê,(legítima Flor-de Goias), adorei o seu carinho e já estou levando a flor para o meu blog.
    Um beijo no seu coração
    Manoel

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  7. Eu ainda não conhecia esse texto de Clarice.
    Adorei.

    Isso transforma meu "sentimento de pecadora" também.

    Um dia desses fui fotografar um ensaio fotográfico num parque.
    Precisava de uma flor.
    E fiquei naquele dilema... pego ou não pego. Por fim, peguei.

    As fotos ficaram ainda mais lindas com as flores que peguei no jardim...

    Não me arrependi, lendo Clarice aqui no seu blog fico mais aliviada também.

    Bjo.

    filhadejose.blogspot.com

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